METODOLOGIA DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA


O QUE ENSINAR EM LÍNGUA PORTUGUESA

                              
O ensino atual da disciplina foca a prática no dia a dia e mescla atividades de fala, leitura e produção de textos desde cedo.
Até os anos 1970, o processo de aprendizagem da Língua Portuguesa era comparado a um foguete em dois estágios, como bem pontuam os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). O primeiro ia até a criança ser alfabetizada, aprendendo o sistema de escrita. Já o seguinte começaria quando ela tivesse o domínio básico dessa habilidade e seria convidada a produzir textos, notar as normas gramaticais e ler produções clássicas.
A partir dos anos 1980, o ensino não é mais visto como uma sucessão de etapas, e sim um processo contínuo. "O aluno precisa entrar em contato com dificuldades progressivas do conteúdo. Desse modo, desenvolve competências e habilidades diferentes ao longo dos anos", diz Maria Teresa Tedesco, professora do Colégio de Aplicação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).
As situações didáticas essenciais para o Ensino Fundamental passaram a ser: ler e ouvir a leitura do docente, escrever, produzir textos oralmente para um educador escriba (quando o aluno ainda não compreende o sistema) e fazer atividades para desenvolver a linguagem oral, além de enfrentar situações de análise e reflexão sobre a língua e a sistematização de suas características e normas.
                Essa nova concepção apresentava inúmeras diferenças em relação a perspectivas anteriores. Desde o século 19 até meados do 20, a linguagem era tida como uma expressão do pensamento. Ler e escrever bem eram uma consequência do pensar e as propostas dos professores se baseavam na discussão sobre as características descritivas e normativas da língua. "O objeto de ensino não precisava ser a linguagem", explica Kátia Lomba Bräkling, coautora dos PCNs e professora do Instituto Superior de Educação Vera Cruz, em São Paulo.
Os primeiros anos da disciplina deveriam garantir a aprendizagem da escrita, considerada um código de transcrição da fala. Dois tipos de método de alfabetização reinaram por anos: os sintéticos e os analíticos. Os primeiros começavam da parte e iam para o todo, mostrando pequenas partes das palavras, como as letras e as sílabas, para, então, formar sentenças. Compõem o grupo os métodos alfabético, fônico e silábico.
Já os analíticos propunham começar no sentido oposto, o que garantiria uma visão mais ampliada do aluno sobre aquilo que estava no papel, facilitando o seu entendimento. Pelo modelo, o ensino partia das frases e palavras, decompostas em sílabas ou letras. "Nesses métodos, o essencial era o treinamento da capacidade de identificar, suprimir, agregar ou comparar fonemas. Feito isso, estaria formado um leitor", explica Maria do Rosário Longo Mortatti, coordenadora do grupo de pesquisa em História do Ensino de Língua e Literatura no Brasil, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), no campus de Marília.
Aqueles que já dominavam essa primeira etapa de aprendizagem passavam para a seguinte. Na escrita, os alunos deveriam reproduzir modelos de textos consagrados da literatura e caprichar no desenho do formato das letras. Para fazer uma leitura de qualidade, o estudante tinha como tarefa compreender o que o autor quis dizer - sem interpretar ou encontrar outros sentidos.
As aulas focavam os aspectos normativos e descritivos da língua e textos não literários - como o acadêmico e o jornalístico - não eram estudados. "O coloquial ou informal eram considerados inadequados para ser trabalhados em sala de aula", explica Egon de Oliveira Rangel, professor do Departamento de Linguística da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo.

Concepções de linguagem alteram modo de ensinar

Na década de 1970, uma nova transformação conceitual mudou as práticas escolares. A linguagem deixou de ser entendida apenas como a expressão do pensamento para ser vista também como um instrumento de comunicação, envolvendo um interlocutor e uma mensagem que precisa ser compreendida. Todos os gêneros passaram a ser vistos como importantes instrumentos de transmissão de mensagens: o aluno precisaria aprender as características de cada um deles para reproduzi-los na escrita e também para identificá-los nos textos lidos. 
Ainda era essencial seguir um padrão preestabelecido, e qualquer anormalidade seria um ruído. Para contemplar a perspectiva, o acervo de obras estudadas acabou ampliado, já que o formato dos textos clássicos não servia de subsídio para a escrita de cartas, por exemplo.
Em pouco tempo, no entanto, as correntes acadêmicas avançaram mais. Mikhail Bakhtin (1895-1975) apresentou uma nova concepção de linguagem, a enunciativo-discursiva, que considera o discurso uma prática social e uma forma de interação - tese que vigora até hoje. A relação interpessoal, o contexto de produção dos textos, as diferentes situações de comunicação, os gêneros, a interpretação e a intenção de quem o produz passaram a ser peças-chave.
 A expressão não era mais vista como uma representação da realidade, mas o resultado das intenções de quem a produziu e o impacto que terá no receptor. O aluno passou a ser visto como sujeito ativo, e não um reprodutor de modelos, e atuante - em vez de ser passivo no momento de ler e escutar.

3 perguntas  Eva Aparecida de Oliveira Rosseto

Professora de Língua Portuguesa do 6º ao 9º ano da EE Doutor João Ponce de Arruda e da EM São Sebastião, em Ribas do Rio Pardo, a 97 quilômetros de Campo Grande.
Quais são as atividades que marcam as suas aulas hoje?

O foco é a análise dos textos, e não o ensino de regras gramaticais. Conforme discuto as produções dos alunos durante as aulas e faço as correções, mostro que faltou uma conjunção ou os melhores usos de um pronome, procurando sempre aliar ao contexto. Mesmo assim, ainda tenho grandes desafios. 

Qual o maior deles?

A falta do hábito de leitura, o que prejudica os alunos no momento da compreensão dos textos. Para tentar solucionar essa questão, procuro apresentar vários gêneros, esmiúço cada um e provoco a interpretação para que a turma possa entender melhor o que está escrito. 

Houve mudanças na maneira de ensinar nos últimos tempos? 

Leciono há 24 anos, mas percebi que nos últimos 20 houve alterações na sala de aula. Antes disso, as fórmulas se repetiam. O livro didático era usado como único material e o foco principal de ensino era a gramática.

As contribuições de Piaget e Vygostsky

Essas ideias ganharam suporte das pesquisas que têm em comum as concepções de aprendizagem sócio construtivistas, que consideram o conhecimento como sendo elaborado pelo sujeito, e não só transmitido pelo mestre. Entre os principais pensadores estão Lev Vygostsky (1896-1934) - que mostrou a importância da interação social e das trocas de saberes entre as crianças - e Jean Piaget (1896-1980) - pai da teoria construtivista. 
Nos anos 1980, Emilia Ferreiro e Ana Teberosky, autoras do livro Psicogênese da Língua Escrita, apresentaram resultados de suas pesquisas sobre a alfabetização, mostrando que o aluno constrói hipóteses sobre a escrita e também aprende ao reorganizar os dados que têm em sua mente. Em seguida, as pesquisas de didática da leitura e escrita produziram conhecimentos sobre o ensino e a aprendizagem desses conteúdos.
Hoje, a tendência propõe que certas atividades sejam feitas diariamente com os alunos de todos os anos para desenvolver habilidades leitoras e escritoras. Entre elas, estão a leitura e escrita feita pelos próprios estudantes e pelo professor para a turma (enquanto eles não compreendem o sistema de escrita), as práticas de comunicação oral para aprender os gêneros do discurso e as atividades de análise e reflexão sobre a língua.
A leitura, coletiva e individualmente, em voz alta ou baixa, precisa fazer parte do cotidiano na sala. "O mesmo acontece com a escrita, no convívio com diferentes gêneros e propostas diretivas do professor. O propósito maior deve ser ver a linguagem como uma interação", explica Francisca Maciel, diretora do Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita (Ceale), em Belo Horizonte.
O desenvolvimento da linguagem oral, por sua vez, apesar de ainda pouco priorizado na escola, precisa ser trabalhado com exposições sobre um conteúdo, debates e argumentações, explanação sobre um tema lido ou leituras de poesias. "O importante é oferecer oportunidades de fala, mostrando a adequação da língua a cada situação social de comunicação oral".
Por esse entendimento da leitura, da escrita e da oralidade, mudam os objetivos da Educação. "Considerar que o objeto de ensino se constrói tomando como referência as práticas de leitura e escrita supõe determinar um lugar importante para o que os leitores e escritores fazem, supõe conceber como conteúdos fundamentais do ensino os comportamentos do leitor, os comportamentos do escritor", diz Delia Lerner no livro Ler e Escrever na Escola, O Real, o Possível e o Necessário.
Para que a aprendizagem seja efetiva, a intenção do educador deve ser a de extrapolar as situações de escrita puramente escolares e remeter às práticas sociais. Dessa forma, possibilita-se aos alunos o contato com gêneros que existem na vida real - e não propor a elaboração de redações escolares sem contexto. "A proficiência do aluno requer a aprendizagem não apenas dos conteúdos gramaticais mas também dos discursivos", diz Kátia.

Mitos pedagógicos

Leitura pelo professor, só para quem não sabe "Em geral, o professor lê para as turmas até a 2ª ou 3ª série. Para os mais velhos, pensa: se eles já sabem ler, não precisam mais de mim", exemplifica Cristiane Pelissari, selecionadora do Prêmio Victor Civita - Educador Nota 10. Na verdade, a atividade é importante sempre e em todas as idades. "Ao ler, o professor apresenta o material e o recomenda. Isso explicita quais os critérios de apreciação utilizados, oferecendo referências a respeito deles", esclarece Kátia Bräkling. 
Lê antes, ganha livro depois Por muito tempo, acreditou-se que o contato com os livros deveria acontecer quando a criança já tivesse o domínio da leitura. "Se não sabe ler, não vai entender nem aproveitar o livro. Mas, se aprender, ganha um título como prêmio", dizia-se. Hoje, no entanto, sabe-se que é com o contato com textos que o aluno estabelece as relações que podem desenvolver comportamentos leitores e ajudar os estudantes a compreender a sua função comunicativa. 
Fala errado, escreve mal É certo que o conhecimento linguístico e a competência escritora causam um impacto na fala. Mas a relação entre ambas as habilidades não é tão estreita assim a ponto de se afirmar que quem fala mal escreve com dificuldade. Como a escrita não é a transcrição da fala, para produzir bons textos é preciso praticar, conhecer e se apropriar dela.

Linha do tempo do ensino da Língua Portuguesa no Brasil

1759 A Reforma Pombalina torna obrigatório no Brasil o ensino de Língua Portuguesa nas escolas. A intenção é transmitir o conhecimento da norma culta da língua materna aos filhos das classes mais abastadas. 

1800 A linguagem é vista como uma expressão do pensamento e a capacidade de escrever é consequência do pensar. Na escola, os textos literários são valorizados, e os regionalismos, ignorados.

1850 A maneira unânime de ensinar a ler é o método sintético. As letras, as sílabas e o valor sonoro das letras servem de ponto de partida para o entendimento das palavras.

1860 Desde os primeiros registros sobre o ensino da língua, a escrita é vista independentemente da leitura e como uma habilidade motora, que demanda treino e cópia do formato da letra por parte do aprendiz.

1876 O poeta João de Deus (1830-1896) lança a Cartilha Maternal. Defende a palavração, modelo que mostra que o aprendizado deve se basear na análise de palavras inteiras. É um dos marcos de criação do método analítico.

1911 O método analítico se torna obrigatório no ensino da alfabetização no estado de São Paulo. A regra é válida até 1920, quando a Reforma Sampaio Dória passa a garantir autonomia didática aos professores. 

1920 Inicia-se uma disputa acirrada entre os defensores dos métodos analíticos e sintéticos. Alguns professores passam a mesclar as ideias básicas defendidas até então, dando origem aos métodos mistos. 

1930 O termo alfabetização é usado para determinar o processo inicial de aprendizagem de leitura e escrita. Esta passa a ser considerada um instrumento de linguagem e é ensinada junto com a leitura. 

1940 As primeiras edições das cartilhas Caminho Suave e Sodré são lançadas nessa década, respeitando a técnica dos métodos mistos, e marcam a aprendizagem de gerações.

1970 A linguagem passa a ser vista como um instrumento de comunicação. O aluno deve respeitar modelos para construir textos e transmitir mensagens. Os gêneros não literários são incorporados às aulas. 

1984 Lançamento do livro Psicogênese da Língua Escrita, de Emilia Ferreiro e Ana Teberosky. A concepção de linguagem é modificada nessa década e influencia o ensino até hoje: o foco deveria estar na interação entre as pessoas.

1997 São publicados os PCNs pelo governo federal para todo o Ensino Fundamental, defendendo as práticas sociais (interação) de linguagem no ensino da Língua Portuguesa. 

Fontes: Os sentidos da alfabetização, Maria do Rosário Longo Mortatti e PCNS

Metodologias mais comuns no ensino de Língua Portuguesa

As aulas de Língua Portuguesa, desde o século 19, foram marcadas pelos métodos de ensino de leitura e escrita nos anos iniciais de escolaridade e normativos nos anos seguintes. Foram as pesquisas dos últimos 30 anos que mudaram esse enfoque. Leia o perfil de cada fase.

MÉTODOS SINTÉTICOS 

Foram predominantes no ensino da leitura desde meados do século 19. A escrita era vista como uma habilidade motora que requeria prática mecânica. Passada a alfabetização, os alunos deveriam aprender regras gramaticais. 
Foco A alfabetização se inicia com o ensino de letras e sílabas e sua correspondência com os sons para a leitura de sentenças. Nas séries finais, só os clássicos são trabalhados, já que a intenção é ensinar a escrever usando a língua culta e a ler para conhecer modelos consagrados. 
Estratégia de ensino As técnicas de leitura adotadas desde cedo são a silábica, alfabética ou fônica. Os mais velhos copiam textos literários sem levar em conta o contexto e o interlocutor. 

MÉTODOS ANALÍTICOS

Surgiram no fim do século 19, em contraposição aos sintéticos. A alfabetização segue como uma questão de treino e o enfoque dos anos seguintes voltado ao debate das normas. 
Foco A alfabetização parte do todo para o entendimento das sílabas e letras. Pouco muda nas técnicas para as séries finais do Ensino Fundamental.
 Estratégia de ensino Mostrar pequenos textos, sentenças ou palavras para, então, analisar suas partes constituintes e o funcionamento da língua. 

PROPOSTA CONSTRUTIVISTA

Ganhou força na década de 1980, com as pesquisas psicogenéticas e didáticas e a concepção interacionista de linguagem. 
Foco O estudante deve refletir sobre o sistema de escrita, seus usos e suas funções. Os objetos de ensino são o sistema alfabético e os comportamentos leitores e escritores. 
Estratégia de ensino Leitura e escrita feitas pelo professor, produção de textos, leitura (individual e coletiva) dos próprios estudantes e reflexão sobre a língua. Textos de diversos gêneros devem ser trabalhados desde o início da alfabetização até os anos finais.

Expectativas de aprendizagem em Língua Portuguesa do 1º ao 9º anos

Ao fim do 5º ano, é importante que o aluno saiba: 

- Compartilhar a escolha de obras literárias, a leitura, a escuta, os comentários e os efeitos das obras lidas com colegas.
- Usar o conhecimento que tem sobre os autores para interpretar o texto.
- Perceber no texto lido a relação entre propósito e gênero de que faz parte.
- Planejar o texto antes e enquanto está escrevendo, levando em consideração o propósito, o destinatário e a posição do enunciador.
- Consultar outros materiais de leitura que colaborem para a elaboração do texto. Revisar a própria produção enquanto escreve, refazendo diversas versões para elaborar um texto bem escrito e tomando decisões sobre a apresentação final dele.
- Buscar e selecionar informações, reunindo material sobre um tema, decidindo que textos serão escolhidos e registrando por escrito aspectos importantes encontrados.
- Aprofundar e reorganizar o conhecimento, fazendo resumos com as ideias principais do texto lido e relacionando as informações lidas com o propósito estabelecido.
- Elaborar textos escritos para explicitar o que aprendeu e preparar exposições orais.
- Narrar oralmente fatos do cotidiano, compartilhando opiniões e debatendo temas polêmicos.
- Informar-se sobre notícias divulgadas em jornais e revistas e prestar atenção em como a publicidade comporta-se, refletindo, identificando o destinatário e discutindo sobre o que vê.

Ao concluir o 9º ano, é desejável que o estudante esteja apto a: 

- Ler individualmente e em grupo, conhecendo os clássicos e identificar recursos linguísticos, procedimentos e estratégias discursivas para relacioná-los com seu gênero.
- Fazer parte de situações sociais de leitura, como as discussões sobre obras lidas e a indicação das apreciadas.
- Escrever breves ensaios sobre obras literárias, expressar seus pontos de vista frente ao texto e levantar argumentos.
- Aprofundar-se sobre determinado autor, lendo suas obras, confrontando-as com interpretações, consultando textos sobre a vida e a produção dele, e explorar o estilo e os temas mais abordados por ele.
- Buscar informações, selecionando estratégias de leitura conforme os propósitos específicos.
- Complementar textos com informações provenientes de outras produções escritas, usando estratégias próprias de cada gênero.
- Organizar debates sobre temas de interesse geral e participar dele registrando dados de várias fontes.

A insegurança na comunicação, principalmente em situações formais, demonstrada pelos escolares, a incapacidade de redação na maioria dos candidatos em concurso vestibular e a dificuldade de compreensão de textos em todos os níveis escolares constituem indicações da importância do ensino na Língua Portuguesa, cujo questionamento vem ocupando uma posição central no contexto educacional.
Essa situação faz com que os professores de Português realizem estudos e pesquisas e apresentem alternativas para melhor funcionalidade desse ensino, a partir da análise das suas deficiências.
Os profissionais da Língua Portuguesa voltam-se às ciências linguísticas como a fonte de onde se podem inferir normas metodológicas para o ensino, que, associadas aos princípios metodológicos, permitem uma tomada de posição mais efetiva sobre o que ensinar e como fazê-lo.
Nossa interpretação é de que o fato metodológico é realmente abrangente, visto encerrar uma filosofia de educação, o pensamento de uma sociedade com peculiaridades locais em permanente e acelerada mudança, e uma teoria linguística.
No Brasil, o ensino da língua materna tem-se desenvolvido quase somente por meio do ensino da gramática tradicional. E o pressuposto básico, nessa acepção, é de que saber a teoria gramatical equivale a saber Português.
A gramática é, portanto, colocada e vista como parte fundamental do ensino da língua. Decorrentes dessas premissa surgem as diretrizes metodológicas: toda a teoria gramatical é sistematizada e estruturada para que o escolar a domine no processo de escolarização. Os conteúdos das oito séries de 1º grau e os das três séries do 2º grau são reunidos num conjunto compartimentado. Há, assim, onze compartimentos, cada um correspondendo a um ano letivo, complementados com exercícios dimensionados, conceitos, regras e exceções.1
Embora essa metodologia de ensino da Língua Portuguesa eivada só de gramática seja desgastante, ela é de procedimento geral em classes de 1º grau.
O posicionamento, visto assim, é fruto de uma tradição histórica, organizada numa concepção clássica do ensino da língua, trazida pelos jesuítas. Em termos concretos, essa tradição de ensino, que procurava seu aperfeiçoamento evitando qualquer alternativa, fazia com que o professor que só havia aprendido gramática, apenas gramática ensinasse, fechando assim um círculo vicioso, com poucas perspectivas de mudanças.
Esse posicionamento foi sendo reforçado e estratificado pelas principais normas legislativas. Em 1959, por exemplo, a Portaria 36, do Ministério da Educação e Cultura (MEC), disciplina a adoção da Nomenclatura Gramatical Brasileira e recomenda seu uso no ensino programático como também em atividades que visem à verificação da aprendizagem. Nessa mesma Portaria são definidas as instruções quanto à seleção dos termos da nova nomenclatura: exatidão científica do termo; vulgarização internacional e a sua tradição na vida escolar brasileira.2 E quanto às recomendações atinentes à aplicação, destaca-se: dá-se importância a revisão da doutrina gramatical e à realização de pesquisas contínuas para detectar os erros mais comuns cometidos pela coletividade escolar, atentatórios à gramática. Se é louvável a intenção da Portaria com relação à revisão permanente da doutrina gramatical - o que nunca foi feito - e com a pesquisa dos fatos linguísticos correntes - o que também nunca foi feito - é lamentável a concepção linguística subjacente à Portaria. É uma concepção defasada da variação linguística, vista como erros atentatórios à gramática, proveniente de um ensino monolítico, onde não se admitiam alternativas, características do ensino tradicional. Por fim, como um simples apêndice, a Portaria faz breve referência a que o ensino se subordine a um embasamento linguístico e a uma técnica dentro da Linguística Aplicada.
É interessante ressaltar que os únicos efeitos concretos da Portaria 36 foram a unificação da nomenclatura gramatical e o reforço da postura tradicional de reduzir o ensino de Português ao ensino da gramática tradicional. A Portaria não abre perspectivas de mudanças na orientação geral do ensino.
Apesar de a Lei 4.024, de 20 de dezembro de 1961, ter representado um avanço em termos de legislação educacional, por dar maior descentralização ao sistema, a essência do ensino da Língua Portuguesa continuou a mesma.
A Lei 5.692/71, se bem que apresente também uma evolução do quadro da legislação, acabou por produzir uma situação extremamente paradoxal no ensino da Língua Portuguesa, quer em termos intrínsecos - contradição entre os pressupostos gerais da lei e seus desdobramentos em textos complementares -, quer em termos extrínsecos - a contradição entre a lei e sua aplicação.
Basicamente, a legislação assume a posição de distinguir um ensino centrado no uso da língua de um ensino a respeito da língua, acrescentando que o primeiro deve preceder ao segundo. Esses dados ficam claros pela leitura do Parecer 853/71.
O artigo 5º desse Parecer afirma que nas séries iniciais, sem ultrapassar a quinta, a língua será desenvolvida sob a forma de Comunicação e Expressão, tratada predominantemente como atividade; em seguida, até o fim desse grau, sob a forma de Comunicação em Língua Portuguesa, tratada predominantemente como área de estudo; no ensino do 2º grau, sob a forma de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira, tratada predominantemente como disciplina.
O artigo 4º define que nas atividades, a aprendizagem far-se-á principalmente mediante experiências vividas pelo próprio educando no sentido que atinja, gradativamente, a sistematização de conhecimentos (parágrafo 1º); nas áreas de estudo, formadas pela integração de conteúdos afins, as situações de experiência tenderão a equilibrar-se com os conhecimentos sistemáticos para configuração da aprendizagem (§ 2º); nas disciplinas, a aprendizagem se desenvolverá predominantemente sobre conhecimentos sistemáticos (§ 3º).3
Como foi dito antes, a contradição se encontra no próprio corpo da legislação, assim como nas situações em que ela é aplicada. Quanto à legislação, a um princípio avançado - dar precedência ao ensino centrado no uso da língua - correspondeu uma aplicação tímida (facilmente percebida no art. 5º) e não coerente, como quando caracteriza os objetivos da área de Comunicação e Expressão para os alunos de 5ª a 8ª série:
Visará introduzir o aluno na simbologia linguística, desenvolvendo suas capacidades de expressão oral e escrita, fixando as estruturas básicas da língua, conduzindo-o a uma evolução do seu pensamento reflexivo (...) permitir a expressão individual, transformando-a em linguagem organizada...4
Quanto à contradição encontrada nas situações concretas de aplicação da lei, pode-se recorrer aos estudiosos da legislação. Mesmo aos que chegam à conclusão da pertinência de tal legislação, não deixam de enfatizar que, apesar de a legislação abrir um campo para a precedência do ensino do uso sobre a sistematização da língua, muito pouco se fez, concretamente, nesse sentido.
Aryon Rodrigues, comentando a Resolução 853/71, fornece explicação dessa situação de contradição entre a realidade e a lei quando diz:
Na prática escolar até agora mais frequente dá-se, por exemplo, que a preocupação prematura e exagerada com a função metalinguística vem a perturbar e mesmo inibir o desenvolvimento das demais funções: não só o excesso de atenção e de tempo destinados, já nas primeiras séries do 1º grau, a falar a língua restringe, senão elimina as oportunidades de cultivar qualquer outra função linguística, mas ainda a apresentação insistente e de forma inadequada de modelos conflitantes com a competência linguística dos alunos acarreta nestes um verdadeiro complexo de incompetência linguística, que tende a bloquear o exercício de todas as demais funções da linguagem.5
Foram vistos, até aqui, dois fatores que dificultam avanços na metodologia do ensino da Língua Portuguesa: de um lado, a quase exclusividade do ensino de gramática - fruto da tradição trazida pelos jesuítas - e, de outro, as contradições internas e externas da legislação.
Poder-se-iam acrescentar outros fatores como a grande defasagem entre as ciências da linguagem e o ensino de Português e, por fim, a grande defasagem entre as práticas realidades decorrentes, principalmente, das transformações pedagógicas e os desafios colocados à escola pelas novas geradas na sociedade brasileira pelo intenso processo de industrialização.
Dessas transformações surgiu um conjunto de problemas que constitui um desafio aos professores que buscam uma diretriz mais funcional ao ensino.
Numa sociedade conservadora, a grande responsabilidade do professor era preparar a criança para essa sociedade. O instrumental a ser usado já fora experimentado e aprovado por gerações, restando apenas adotá-lo. Era característica dessa época a apresentação de produtos feitos e acabados, assim como a memorização. Surgiram, então, as transformações sociais decorrentes da industrialização. Seus valores começaram a passar pelo crivo de uma forte e contínua crítica e muita rejeição.
Despontaram, assim, as novas formas de vida, as alternativas coexistentes, as minorias. Perdeu a existência o homem-modelo de uma sociedade conservadora e estoica. O modelo está sendo cada dia repensado. (Observe-se que se trata de uma análise de tendências e não de fatos. Os fatos estão eivados de contradições das duas tendências, o que faz com que o papel do professor sofra também essas contradições).
Nesta sociedade, cabe ao professor a tarefa de levar a criança a saber questionar, a criar novos modelos. Para essa nova função, se o professor continuar a trabalhar com o mesmo instrumental, sentir-se-á fatalmente insatisfeito, seja porque ciente das mudanças, percebe-se defasado em sua formação, seja porque, indiferente ao processo inovador, continua a visar um modelo anacrônico cujo resultado nulo tem efeito frustrador para suas aspirações profissionais.
Um dos resultados do processo peculiar de desenvolvimento da sociedade brasileira e latino-americana é a situação socioeconômica de sua população, distribuída em uma pirâmide cujo cume se está tornando cada vez mais alto mais fino e cuja base se torna cada vez mais alargada. Uma das consequências dessa situação é o analfabetismo e a marginalização cultural. Sem dúvida, o analfabetismo tende a desaparecer à medida que se resolvem os problemas socioeconômicos. No entanto, a maneira como é visto o analfabetismo tem repercussões variadas no desenrolar da questão socioeconômica e educacional.
Se o analfabetismo é considerado desligado da questão socioeconômica ou causador dela (desde a simples afirmação de que pobre é fruto de sua ignorância, até a mais sofisticada, de que essas pessoas são marginalizadas e tendem a praticar desajustes sociais por falta de instrumentalização cultural), parte-se, em geral, para a aplicação da teoria compensatória (como se fez em diversos locais, por exemplo, nos Estados Unidos, onde o próprio governo a adotou), julgando-se que "dando cultura" a essas populações resolver-se-iam seus graves desajustes. Essa posição é traduzida, na prática, pelo menosprezo da escola aos valores das crianças oriundas das faixas marginalizadas da população, menosprezo esse que será uma das razões de seu fracasso escolar. Críticas de ordem teórica e empírica foram levantadas contra tal posicionamento. *
Se o analfabetismo for encarado como consequência da situação socioeconômica, e é assim que o entendemos, outro será o sentido e o valor do ensino de Português. Poderá desempenhar papel importante na medida em que cria condições para que as crianças possam ampliar seu universo de comunicações como perspectiva de situar-se melhor em meio aos conflitos decorrentes de sua situação socioeconômica. A leitura ganha valor à medida que ela é caminho para novas informações, para aprendizagem de visões diferentes do mundo.
A leitura passa a ser instrumento de libertação para a pessoa interpretar, refletir, formar-se, conscientizar-se. O mais importante da leitura, nesse enfoque, é que ela nos torna pensadores, pois irá instrumentalizar o indivíduo para uma compreensão mais ampla do seu mundo e para a comunicação.
Dessa forma, a escola ganha novo sentido, o professor já não é a única fonte de informação.
Outro desafio para o ensino de Português é a extensão social dos mais variados meios de comunicação, em decorrência dos avanços tecnológicos das últimas quatro décadas. O indivíduo está cercado, por todos os lados, pela força dos meios de comunicação, força essa que motiva as diretrizes da vida, que impulsiona, que faz aparecer interesses e necessidades.
E, nesse campo, os veículos de comunicação marcam presença: seja pelo número de horas absorvidas pela assistência aos programas de TV, seja pela gama infindável de opções no campo das publicações. O trabalho do professor de Português ganha realce em face dessa situação, visto o aluno precisar adaptar-se criticamente a ela, desenvolvendo a capacidade de maior compreensão dessas formas de comunicação e evitando ser um receptor passivo: ele precisa discutir a mensagem postando-se ativamente diante das situações criadas.
Um último dado a ser considerado é o fato de a língua Portuguesa ocupar posição de destaque na escola de 1º e 2º grau, isto por ser a disciplina base das outras matérias de estudo, pois é
veículo de todos os conhecimentos que a escola proporciona: fala-se e lê-se em português ao discutir sobre matemática ou estatística, sobre ciências naturais ou químicas. Tudo reconduz ao português a todo momento da vida escolar. O ensino de português é, por assim dizer, uma espécie de educação permanente instalada na forma de todas as disciplinas.6
Se o indivíduo não conhece bem a Língua Portuguesa, não pode aprender adequadamente aquilo que deseja. Se não aprende, não assimila e, por outro lado, torna-se incapaz de elaborar um pensamento lógico.
No entanto, tudo o que vimos discorrendo sobre ensino da Língua Portuguesa só se tornará efetivo se as suas finalidades forem reexaminadas e seus métodos revistos a partir de teorias recentes formuladas e que fornecem uma compreensão mais abrangente do fenômeno linguístico. Dessa forma esse ensino assume, nos seus multi aspectos, importância e novas perspectivas; e, na discussão das formas que ele pode assumir, é essencial uma fundamentação científica, abandonando-se a gramática tradicional como centro de ensino.
Diante das inter-relações da língua com todos os aspectos da vida do indivíduo, fica claro que o ensino não pode restringir-se à gramática tradicional e que as alternativas deverão encontrar caminhos para a prática da abrangência. Esse caráter abrangente é decisivo na metodologia do ensino da Língua Portuguesa e resulta na necessidade de se analisar o descompasso entre a investigação teórica da linguagem e a fundamentação do ensino de Português.
Observou-se, até aqui, que no Brasil o ensino da Língua Portuguesa, apesar da sua importância e multi aspectos, tem-se conduzido quase somente por meio da gramática tradicional, sendo isso responsável por grande parte do insucesso dos alunos na aprendizagem da língua materna e da falta de segurança na comunicação.
Os próprios linguistas nos seus estudos já não utilizam tal gramática como modelo analítico, salvo criticamente, como ponto de partida para outros modelos mais coerentes e abrangentes.
O ensino la Língua Portuguesa só pode ser desenvolvido a partir de uma reflexão sobre a própria noção de língua e pela análise da situação linguística em que todo o indivíduo está envolvido.
Isso implica dois aspectos:
1) entender o domínio da língua não apenas como um saber sobre ela, mas primordialmente como o domínio de um conjunto de habilidades de uso da língua em cada situação;
2) aplicar princípios la Linguística na metodologia do ensino de línguas.
Os estudos atuais procuram descartar, sobremaneira, não só o aspecto sistemático e criativo da linguagem, mas também a adequação realizada em cada momento do ato linguístico. A tendência é a de superar reduções excessivas praticadas em momentos precedentes na investigação e integrar aspectos complementares decorrentes da justa avaliação das dimensões social e individual dos usos como centrais e determinantes.7
Paralela às teorias e procedimentos da Linguística surge a Linguística Aplicada, como disciplina científica, que é o ponto de convergência de uma multiplicidade de investigações de alguns setores das ciências sociais, pedagógicas e didáticas de línguas.
A aplicação da Linguística implica uma compreensão das coordenadas e dos termos que configuram o ato verbal e do complexo de funções nele inseridas.
Compreende-se, desta forma, que o ensino da língua deve estar associado a uma ciência que é a Linguística. Contudo, repensar o ensino de língua como fundamento na Linguística não significa introduzir diretamente, nas escolas de 1º e 2º graus, as formulações teóricas mais recentes; nem se trata de realizar um exercício meramente mecânico de passar as conclusões teóricas para a atividade pedagógica; é, isto sim, desenvolver uma pedagogia de Português a partir de se assumir uma ou outra ou várias das diferentes teorias linguísticas. É um trabalho indireto e, por isso, interdisciplinar.
Uma compreensão mais rica do fenômeno linguístico - fornecida pelas formulações teóricas - será o suporte para a definição de novas diretrizes para o ensino.
A linguística aplicada ao ensino de línguas absorverá os aspectos centrais que decorrem do conhecimento científico da natureza e funcionamento da linguagem e das línguas, da sua aquisição e domínio por parte de um falante, do papel que desempenham no seio das comunidades, e suscitará que informem a didática, constituindo-se em instrumento de configuração, de equacionamento e também de resolução de problemas que atingem esta área de atividade.8
Também não é o caso de introduzir uma terminologia nova - oriunda das teorias linguísticas - nas gramáticas tradicionais e no ensino - como tem ocorrido com certa frequência - e pensar que se está com isso produzindo uma mudança qualitativa no ensino de língua.
O ponto crítico do ensino de Português tem sido a ênfase unilateral ao estudo da teoria gramatical. Nossos alunos passam onze anos nas escolar e, frequentemente, o que lhes é apresentado é apenas metalíngua - conceitos, regras, exceções.
Em estudos realizados sobre a gramática tradicional, FARACO acentua que a língua continua a ser vista de modo cristalizado: para as gramáticas tradicionais só existe uma língua portuguesa (aquela prevista por elas); as variantes linguísticas, em geral, são vistas como formas erradas, condenadas, não recomendáveis, uma espécie de corrupção da língua verdadeira, pura.
Tem-se a impressão que a língua é um fenômeno homogêneo e imutável no tempo: os fatos que as gramáticas apresentam são, em geral, arcaicos.9
Entre os motivos apresentados como contrários ao ensino da teoria gramatical, destacamos dois: primeiro, o fato de que é possível dominar a língua sem conhecer-lhe a teoria gramatical, como acontece na aquisição da língua pela criança; segundo, o fato de que a teoria gramatical ensina nas escolas é bastante imprecisa, defasada em relação às mudanças ocorridas na língua.
Concluímos, então, que não se pode restringir o ensino da Língua Portuguesa ao ensino da teoria gramatical.
Mas, além de ter feito pouco esforço no sentido de criar uma linguística aplicada ao ensino de Português, com suas naturais consequências para a formação do professor de 1º e 2º graus (basta lembrar que as normalistas não tem nenhuma formação linguística), há um outro problema que afeta esse ensino, a saber: a falta de descrições razoáveis da língua portuguesa nas modalidades em que ela é falada aqui no Brasil, o que dificulta a orientação do seu ensino.
RODRIGUES afirma que uma das tarefas da Linguística no Brasil é a investigação do nosso idioma e que há necessidade de se analisar ou reanalisar a língua portuguesa de um ponto de vista puramente descritivo.10
A esse respeito, ha necessidade de que em todos os recantos de nosso país sejam feitas pesquisas linguísticas que venham contribuir de forma prática para elaboração de uma descrição da língua nacional que servirá de ponto de partida à atualização do ensino de nossa língua materna.11
Se, de um lado, uma descrição melhor da língua nos vai fornecer um panorama mais atualizado dela - e poderemos trabalhar nas escolas com uma língua menos arcaica e mais próxima das experiências e necessidades de nosso alunos -, será também de utilidade adiantar diretrizes gerias para o ensino da língua como base na aplicação de uma teoria que nos forneça uma noção mais abrangente dessa língua, vista não apenas como um sistema formal, mas também como um sistema de opções comportamentais.
Em relação ao ensino de línguas, dois grandes objetivos podem ser esclarecidos. Se entendermos língua como um sistema de opções comportamentais, o objetivo será desenvolver nos alunos as habilidades de expressão e compreensão de mensagens verbais: o uso ou apropriação da língua, em situações sociais concretas de intercâmbio linguístico. Se encarada como objeto de estudo - um sistema a ser identificado e descrito - o objetivo passará a ser o conhecimento consciente do sistema linguístico, saber a respeito da língua. A ênfase num ou noutro caracteriza um ensino prático ou mais teórico.
Deve-se ressaltar, contudo, que a ênfase dada a um deles não exclui o outro, e que no ensino de 1º grau deve predominar o desenvolvimento das habilidades de comunicação sobre a aquisição de conhecimentos a respeito da língua, uma vez que outros conhecimentos a respeito da língua só podem ser desenvolvidos nos alunos a partir de um bom domínio da mesma por parte deles.12
Um modelo linguístico aplicável ao ensino deveria, segundo LOBATO, englobar, além dos elementos propriamente linguísticos, principalmente outros aspectos tais como o contexto linguístico dos falantes e as variações no uso da língua pois dominar uma língua significa dominar, além das regras de boa formação de frases, os princípios e condições de utilização adequada dessas frases num dado contexto linguístico e numa dada situação de comunicação.13
Essa abordagem tem merecido, recentemente, especial atenção dos sócio linguistas e, nesse campo, os estudiosos têm dado maior destaque ao aspecto sócio semântico das opções linguísticas que caracterizam a heterogeneidade do uso da língua entre uma determinada população.
Um das linhas diretrizes desta investigação reside na tentativa de integração, na descrição linguística, de considerações referentes aos contextos social e cultural em que tem lugar o uso. Essa posição é atualmente assumida, com particular vitalidade, por HALLIDAY, que se preocupa não apenas em propor um modelo estático das estruturas linguísticas, mas, também, em mostrar como estão integradas no sistema linguístico as possibilidades funcionais da língua: para ele a língua é o que é pelas funções que desempenha, Em suma, para ele não há distinção entre estrutura e uso, estando ambos interligados.
Tendo em vista os aspectos acima apresentados, a adoção da teoria linguística de HALLIDAY parece relevante para a reformulação do ensino da Língua Portuguesa, à medida que HALLIDAY, tomando por base uma visão sociolinguística peculiar, amplia as concepções correntes de língua, passando a entendê-la como um sistema de opções comportamentais. Consequentemente, essa concepção possibilitará uma nova metodologia, mais dinâmica para o ensino vernáculo.